Por Jahmaycon
Quando eu era coordenador de escola, um grupo de alunos entrou em contato comigo para solicitar um espaço dentro do colégio, onde eles pudessem se reunir para estudarem para uma prova de vestibulinho que fariam, se não me engano, para entrarem na Etec. Quando eles disseram qual o horário em que estariam reunidos e que tudo que precisavam era de um espaço seguro e adequado para estudarem, não hesitei em responder que poderiam utilizar a escola, pois espaço não faltava, e (até onde eu pensava) a escola lhes pertencia. Havia salas de aulas vazias, além da biblioteca e outros espaços que, havendo necessidade, também poderiam ser utilizados.
Orientei, então, a procurarem a direção da escola para alinharem o espaço onde poderiam estudar, pois, além de ser um horário em que eu não estaria no colégio, obviamente seria preciso comunicar a todos e organizar o uso para que não interferisse na rotina dos outros estudantes. No dia seguinte (ou ainda no mesmo dia, não lembro ao certo), fui interpelado por eles com tom de desapontamento: “Jahmaycon, você disse que teria espaço, mas a diretora falou que não tem.”.
Sabendo-se que havia espaço de sobra na escola, fica a pergunta: por que eles não podem estar na escola fora do horário de sala de aula? Aliás, por que eles não podem estar fora da sala de aula em circunstância não esperada sem serem advertidos? “Senhores inspetores, não deixem os alunos transitarem pelos corredores”; “Senhores professores, por que seus alunos não estão em sala de aula?” “Senhores alunos, não é permitido ficar na escola depois do horário de aulas”. Com tantos problemas em transitar por um espaço que lhes pertence, fica nitidamente aquela sensação que, muitas vezes, os alunos não são bem vindos na escola.
Numa situação como a ocorrida, penso que talvez eles usassem por uma ou duas ocasiões, ou até mesmo nenhuma, mas apenas o fato de se sentirem acolhidos pela escola já poderia ter contribuído para criar uma sensação de pertencimento e, consequentemente, valorização da instituição. Ao invés disso, o que se criou na mentalidade daquele grupo foi o oposto, a sensação de que aquele espaço não é deles. Muitas vezes, até mesmo a forma de negar interfere, afinal a linguagem é elemento chave para acolher qualquer indivíduo. É possível que não haja possibilidade de uso numa situação como essa, portanto, sendo esse o fato, basta ser sincero ao justificar a razão, que eles vão entender. Do lado oposto, se há espaço e se nega, eles percebem o real motivo da negativa “não os querem ali”. Agora imagine quando a negativa de uso de espaço disponível, que em tese deveria servir aos estudantes, vem com uma linguagem agressiva… Que tipo de sentimento isso gera?
O mais incrível é que esses mesmos gestores vivem perguntando nas reuniões com os professores por que os alunos não valorizam a escola. Quando eu sugiro essa mudança de tratamento, na maioria das vezes sou sumariamente ignorado, outras, recebo um olhar de desaprovação e muitas vezes ouço palavras de desdém ou até deboche, como se ser gentil e educado fosse uma utopia. Se queremos uma mudança de comportamento por parte de um grupo de pessoas, precisamos agir da forma como gostaríamos que eles agissem. Não seremos valorizados se menosprezamos. Não seremos respeitados se desrespeitamos. Não teremos gentileza se somos agressivos e nos achamos superiores. Não existe classe de seres humanos superiores, o que existe é experiência e conhecimentos avançados que devem ser compartilhados de maneira gentil e educada. Aliás, que não se confunda gentileza com fraqueza e falta de regras, pois em todas as áreas existem muitos grosseirões extremamente fracos, sem comando e coniventes com a desordem.
A educação se faz pelo exemplo, não por gritos e imposição sem justificativa.
Jahmaycon – Jornal Choraminhices.
A probição renasce como uma Fênix das Cinzas de tempos em tempos, quando garoto de 15 anos li Proibido Poibir de Ricardo Gondim, um livro muito fininho, lamento ele se perder no meio do caminho da Teologia Liberal e Teologia do Processo.
A Escola sempre proibe por causa de regulamento sem sentido, as regras de jogo entre alunos e professores, quando se trabalha muito tempo na Educação se você for otimista inicial, transforma em um pessimista frio e calculista, ou um realista inicial você consegue se manter por um bom tempo.
Segundo o Velho Foucault os diretores empresariais e diretores escolares sofrem da Síndorme do Pequeno Poder, o segredo da Proibição pode ser resolvido com as conversas cheias de franqueza com dizia David Foster Wallace.
Então, Demetryus, apenas reforçando o foco do texto, que está mais pautado na linguagem e forma de conduta do que na regra em si. Todos nós sabemos das dificuldades e do aspectro amplo que é gerir uma escola. Já fui gestor e seu da complexidade e defendo essa nova abordagem de tratamento no cumprimento, não na exclusão delas.
Gostei muito da reflexão e dos contra-argumentos apresentados. Sou defensor ferrenho desse meio termo e obviamente o estabelecimento de regras é essencial para isso. É impessável a hipótese de se conseguir um ambiente educacional se os alunos ficarem circulando a esmo pela escola. O meu texto toca no ponto da gestão dessa movimentação e não necessariamente na retirada de regras. Estabelecer e transmitir isso de uma forma clara e apelando para a compreensão das regras e ao perceber a necessidade dessa circulação que via de regra é uma demanda do professor e deixar os alunos a vontade para utilizar, de maneira ordeira, os espaços disponíveis sem gerar esse sentimento de “seu lugar é só na sala de aula”, é conseguir esse equilíbrio.
Excelente reflexão! Texto maravilhoso. Parabéns!!!
Em tempos de Educação Integral, é fundamental adotar uma abordagem inovadora. O ‘não’ autoritário e a falta de soluções não nos cabem mais, pois buscamos formar estudantes autônomos, críticos e protagonistas, capazes de reflexão e ação social.
Situações como essas servem de termômetro para a necessidade de uma real gestão democrática e participativa. Logo, é preciso alinhar todos os agentes envolvidos, incluindo o Grêmio Estudantil, para fortalecer o diálogo entre a gestão escolar e os demais estudantes, por exemplo.
Juntos, gestores escolares e gremistas poderiam (e podem) ressignficar a visão inicial e aproveitar melhor os espaços disponíveis para criar um ambiente de aprendizagem colaborativo e inclusivo, aberto à comunidade escolar, mas previamente alinhado e organizado, em conformidade com as regras gerais da unidade escolar.
Para cada caso uma realidade.
Há possibilidades de flexibilidade em alguns casos, como me parece nesse citado por você.
Porém quando falamos na questão cultural da escola, a teoria e a prática nos parece distante, tanto por parte de algumas gestores/docentes e funcionários da unidade, quanto por parte de alguns estudantes e familiares.
Mas acredito sim, que seja possível construir essa escola em que os alunos são bem vindos, mas demanda de um projeto consistente e entrosado entre os envolvidos.
Texto incrível, retrata o sentimento de todos.
No que eu acredito:
A gestão escolar desempenha um papel essencial na criação de um ambiente educacional inclusivo, acolhedor e democrático. No entanto, como gestores, também enfrentamos o desafio de equilibrar a segurança, o bom funcionamento da escola e a promoção de uma atmosfera de pertencimento entre alunos e comunidade. Às vezes, decisões administrativas podem ser interpretadas como restritivas, mas elas se fundamentam no compromisso com o bem-estar e a proteção de todos os estudantes. A questão de disponibilizar espaços escolares fora do horário letivo é um bom exemplo disso, e pode ser abordada de forma construtiva, analisando o papel amplo e muitas vezes invisível dos gestores, cuja dedicação vai além das decisões de curto prazo e das aparências superficiais.
A escola é, por natureza, um espaço democrático, mas essa democracia não significa a ausência de estrutura e organização. É responsabilidade dos gestores garantir que o ambiente escolar seja seguro e funcional, atendendo tanto as necessidades individuais quanto coletivas. Para manter essa organização, certas normas e diretrizes são estabelecidas, considerando fatores como segurança, responsabilidades de supervisão e o compromisso com a manutenção dos espaços. A negativa de acesso em horários fora do padrão, portanto, não significa desvalorização dos alunos, mas uma decisão de cautela que se alinha com a responsabilidade legal e moral dos gestores de proteger os estudantes e o patrimônio público. Isso não significa, em nenhum momento, que se trata de um ambiente fechado e restritivo, mas sim, que se busca um funcionamento ordenado, pautado pela responsabilidade e pela segurança.
Outro ponto importante é o papel social desempenhado por gestores e equipe escolar, que muitas vezes realizam ações de assistência social, permanecendo anônimos para proteger a dignidade dos alunos. Por trás das demandas administrativas, existe uma gestão comprometida em atender as necessidades essenciais de seus estudantes, seja com a busca por parcerias para fornecer calçados, uniformes ou alimentos. Em contextos de vulnerabilidade, é frequente que a equipe escolar atue para suprir demandas sociais que vão além do currículo formal. Essas ações, quase sempre invisíveis ao público, demonstram a extensão do comprometimento dos gestores em construir uma escola que atenda aos estudantes em todas as suas necessidades, tornando-se um espaço de acolhimento e suporte.
O ideal de pertencimento na escola é um objetivo compartilhado entre a gestão e os professores. Contudo, para que isso ocorra de forma efetiva, é importante que todos respeitem as normas e entendam os limites impostos para garantir o funcionamento adequado e o respeito mútuo entre os diferentes membros da comunidade escolar. A escola é uma instituição diversa, atendendo alunos de variados contextos e com diferentes necessidades. Nesse cenário, cabe aos gestores o difícil papel de conciliar esses interesses diversos, promovendo um ambiente que seja ao mesmo tempo inclusivo e seguro.
A construção de uma escola democrática não se limita à permissão irrestrita de acesso ou uso dos espaços, mas está pautada no respeito às regras que permitem a convivência saudável. A escola democrática não significa a ausência de limites, mas sim a implementação de políticas inclusivas e participativas que considerem o bem-estar coletivo. Os gestores buscam atender as demandas dos alunos, desde que estas não conflitem com a segurança e o bom andamento do ambiente escolar, agindo sempre com transparência e disposição para o diálogo.
Portanto, os gestores educacionais têm a responsabilidade de construir um ambiente onde o respeito, a segurança e o pertencimento coexistam. A escola é um espaço democrático e acolhedor, mas essa acolhida também se alinha com o dever de proteger e administrar de maneira responsável. Essa estrutura organizada, somada à assistência social silenciosa, é o que permite que o ambiente escolar seja realmente inclusivo e sustentável a longo prazo.
Concordo com você Fernanda – um espaço sem a supervisão e a orientação não funciona e sabemos que os nossos adolescentes ainda necessitam deste acompanhamento. Na maioria dos casos também precisamos da permissão dos Pais para que os alunos estejam fora do período de aulas dele. O equilíbrio se faz constante, as regras se fazem necessárias e a segurança é primordial .
Adorei o texto e seus questionamentos.
É inegável que a escola deve ser um espaço acolhedor e que os alunos se sintam à vontade dentro dela, especialmente considerando que é um ambiente que lhes pertence. No entanto, imagine se os alunos pudessem sair da sala a qualquer momento e sem motivo, como isso impactaria o ensino e a aprendizagem? O que seria de uma instituição que já enfrenta desafios em manter a ordem? O caos seria uma realidade. Dentro de qualquer escola, já se viveu situações em que a falta de disciplina gerou problemas, como a interrupção das aulas, desrespeito aos professores e um ambiente propício a se tornar inseguro tanto para alunos quanto para funcionários. A disciplina não é apenas uma questão de controle, mas sim de respeito mútuo e aprendizado.
A proposta de que os alunos possam estar fora da sala de aula em circunstâncias não esperadas é válida, mas precisa ser acompanhada de um entendimento sobre o papel das regras e, especialmente, da supervisão. É importante reconhecer que os alunos, dentro do ambiente escolar, precisam de supervisão constante, seja por parte de professores, inspetores ou diretores. Embora o foco nas atividades pedagógicas não dependa exclusivamente dessa vigilância, a supervisão desempenha um papel essencial em direcionar a atenção dos alunos, minimizar distrações e prevenir situações indesejadas, além de garantir a segurança de todos. As regras, por sua vez, existem para proteger, organizar e assegurar que todos possam usufruir do ambiente escolar de maneira saudável.
Por fim, acredito que a escola deve ser um espaço onde a liberdade de movimento é equilibrada com a responsabilidade e o respeito às normas coletivas. É verdade que, em muitos casos, a rigidez excessiva pode fazer os alunos sentirem-se desconfortáveis ou “não bem-vindos”. Contudo, o desafio é encontrar um equilíbrio entre acolhimento e disciplina.
Texto maravilhoso muito bom !bem escrito, está de parabéns.
Pontos fortes do texto:
– A narrativa pessoal torna o texto mais envolvente e crível.
– A crítica construtiva e reflexiva é bem fundamentada.
– O autor oferece soluções e sugestões para melhorar a gestão educacional.
No geral, o texto é uma reflexão importante sobre a importância da gestão educacional e do tratamento dado aos alunos. O autor apresenta argumentos válidos e sugestões práticas para melhorar o ambiente escolar.
O texto de Jahmaycon realmente toca em pontos importantes sobre a gestão educacional e a importância do respeito e empatia no ambiente escolar.
Ótima reflexão ! Foi uma honra ter essa troca com você , e poder reafirmar o desejo de não se tornar esse poço de reclamação.